Legislação brasileira precisa ser mais rigorosa, dizem analistas sobre vazamento da Chevron

Hanrrikson de Andrade
Do UOL Notícias, no Rio de Janeiro
Rogério Santana/Divulgação
A multa de R$ 50 milhões que será aplicada à empresa Chevron pelo vazamento de óleo no campo do Frade, na bacia de Campos, litoral do Rio de Janeiro, é "inócua" e "insuficiente para resolver o problema", afirmam especialistas ouvidos pelo UOL Notícias. O acidente ambiental foi detectado no último dia 8, quando funcionários da Petrobras avisaram a Chevron sobre uma mancha de óleo na água.
A multa de R$ 50 milhões anunciada nesta segunda-feira (21) pelo Ibama é o valor máximo previsto para penalidades administrativas aplicadas pelo órgão ambiental. O valor, entretanto, deve ser maior devido a outros fatores que ainda devem ser analisados pelo governo federal, como omissão da empresa e falta de equipamentos para lidar com o vazamento.

De acordo com o oceanógrafo e professor universitário David Zee, nomeado perito pela Polícia Federal para acompanhar o caso, a punição não fará com que as empresas do ramo passem a investir em mecanismos de prevenção.

"Essa multa é inócua. Principalmente porque ela não visa ao objetivo principal, que seria evitar ou minimizar os riscos de futuros vazamentos. Essa multa não atinge o cerne do problema. As empresas vão continuar negligenciando a necessidade de investimento em mecanismos efetivos de prevenção", diz Zee, que é professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

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Bacia de Campos

O acidente na bacia de Campos ocorre pelo menos desde o dia 8 deste mês, mas as informações sobre o volume real do vazamento são divergentes

Segundo o especialista, o recente vazamento de óleo na bacia de Campos precisa ser utilizado no sentido de motivar um debate acerca da legislação ambiental no país.

"O Brasil precisa repensar as suas normas e leis para estabelecer mecanismos de prevenção, em especial no que diz respeito à exploração da camada do pré-sal", afirma.

"Está na hora de o governo ser um exemplo de legislação cuja tônica seja a prevenção. Eu até acho que a ANP (Agência Nacional do Petróleo) tenha boa vontade e interesse ante ao cenário atual, mas o órgão precisa se adaptar e inovar frente aos novos desafios do pré-sal. Essa descoberta colocou o Brasil na condição de exportador, temos que fazer normas mais promissoras. Hoje as leis são pífias", complementa.

Zee também criticou os procedimentos de emergência tomados para conter o vazamento. "A empresa deveria ter dado uma resposta em menos de 48 horas para cercar a mancha e contê-la, e posteriormente levar o material para o continente a fim de ser tratado. Mas nesse caso da Chevron, a resposta só veio cinco ou seis dias depois. Tudo foi feito de forma equivocada", alega.

Já a professora de planejamento energético da Coppe/UFRJ (Programa de Pós-Graduação de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro) Alessandra Magrini compara a multa que será aplicada à empresa americana com as punições previstas pelo Código Brasileiro de Trânsito no sentido de ilustrar a falta de rigor. "Se você avança um sinal, recebe uma multa x. No entanto, se você avança um sinal e provoca um acidente com vítimas fatais, essa mesma infração ganha uma dimensão muito maior. O valor da multa deveria ser proporcional ao impacto causado por esse tipo de acidente", afirma.

Segundo ela, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) deveria renovar a legislação estabelecendo critérios mais claros, além de elencar os acidentes mais graves de acordo com os possíveis danos provocados. Essa medida serviria para prever a aplicação de multas "equivalentes", isto é, adequadas à potencialidade de cada ocorrência. "Do contrário, não há compensação aos danos causados.”

Magrini também sugere que os órgãos brasileiros avaliem o sistema internacional de exploração de petróleo com o intuito de estabelecer normais mais eficazes.

"Nos Estados Unidos, a legislação prevê uma multa máxima de US$ 75 milhões. No caso Exxon Valdez [acidente ocorrido no Golfo do México, em 1989], entretanto, a empresa não foi apenas punida, mas estimulada a criar um fundo de US$ 20 bilhões a fim de limpar e recuperar as áreas impactadas", disse.

Entenda o vazamento

O acidente na bacia de Campos ocorre pelo menos desde o dia 8 deste mês, mas as informações sobre o volume real de óleo são divergentes.

O auge do vazamento se deu no dia 11 de novembro, quando até 600 barris de petróleo vazavam diariamente na região, segundo a ANP. Depois esse percentual foi diminuindo. Na segunda-feira (21), o presidente do Ibama afirmou que o derrame havia sido contido.

O presidente da subsidiária brasileira da Chevron, George Buck, calculou em 2,4 mil barris (381,6 mil litros) o volume total de petróleo vazado. Essa foi a primeira estimativa feita pela Chevron sobre o total de óleo que vazou no desastre.

Buck disse em entrevista coletiva na segunda-feira (21) que todos os esforços estão sendo feitos para retirar o petróleo que vazou e que a companhia está utilizando materiais permitidos pelo Ibama para fazer esse trabalho.

Buck voltou a assumir total responsabilidade da empresa pelo vazamento e ressaltou que o produto será retirado da superfície. "É inaceitável qualquer óleo na superfície e vamos tomar todas as providências para isso."

O delegado da Polícia Federal, Fábio Scliar, que investiga o caso, diz que ficou sabendo do acidente pela imprensa, mas que desde então tem recebido relatórios da empresa sobre o acidente e sobre seu controle. Foram expedidas intimações para depoimentos de sete funcionários, entre engenheiros e representantes do corpo gerencial da empresa. Além disso, a PF também solicitou ao Ibama e à ANP os relatórios sobre a fiscalização exercida na área da perfuração desde o conhecimento do acidente.

Segundo Scliar, a Chevron pode ser indiciada por dois crimes ambientais. A Polícia Federal investiga ainda indícios de que funcionários estrangeiros da empresa, que trabalhavam na área da perfuração onde ocorreu o vazamento, não tinham permissão para trabalhar no Brasil.

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